Auditor fiscal aponta as diferenças entre marketplaces e prestadores de serviço sob demanda


É preciso diferenciar marketplaces de prestadores de
serviços sob demanda com precificação tabelada. Esta é uma das premissas que
foram adotadas pelo auditor fiscal Sergio Aoki, da Superintendência Regional do
Trabalho de São Paulo (SRT-SP), para autuar a Rapiddo esta semana e multá-la em
R$ 1 milhão por supostas infrações trabalhistas. Aoki conversou com Mobile Time
nesta quinta-feira, 7, para explicar os argumentos que embasaram a sua
autuação.

A Rapiddo é uma startup que procura conectar motoboys a
clientes corporativos que precisam fazer entregas rápidas dentro das grandes
cidades. A empresa se considera uma intermediadora cuja plataforma faz a
ligação entre as duas pontas. Com isso, entende que os motofretistas não são
seus funcionários, mas profissionais autônomos, que usam a sua solução para
conseguir trabalhos de entrega. Aoki discorda. Para explicar, ele faz uma
comparação com outros apps que, no seu entendimento, seriam efetivamente intermediadores,
ou marketplaces, como o Mercado Livre:

“No Mercado Livre as pessoas se cadastram como
vendedores e podem vender o que quiserem, pelo preço que bem entenderem e do
jeito que acharem melhor. Chamamos isso de marketplace. É uma vitrine de
negócios. O Mercado Livre facilita essa conexão entre vendedor e comprador.
Isso é uma intermediação efetivamente. O vendedor tem autonomia para definir o
seus produtos e seus preços”, diz.

Ele cita como outro exemplo de intermediação o portal
BoaConsulta, que funciona como um marketplace de médicos e dentistas: nele o
profissional disponibiliza o seu currículo e tem a liberdade para definir o
preço da consulta, enquanto o paciente, por sua vez, pode escolher quem
preferir.

“Na Rapiddo é diferente, ela não faz intermediação. A
empresa não dá liberdade para o motoqueiro definir seu preço. E o trabalho tem
que ser do jeito que a Rapiddo determina, senão o motofretista perde pontuação
e pode até ser eliminado da plataforma”, compara. “Na Rapiddo, com
certeza há uma relação de emprego (entre a empresa e os motofretistas)”,
acrescenta.

Na compreensão do auditor fiscal, startups como a Rapiddo
seriam na verdade prestadoras de serviço sob demanda com preço tabelado que
tratam como profissionais autônomos trabalhadores que atuariam como seus
funcionários. A estratégia faz com que a empresa economize os custos com
diversos encargos trabalhistas e previdenciários, minimizando também seus
riscos em caso de acidentes de trânsito com os motoqueiros. Paralelamente, essa
competição prejudica as empresas que atuam dentro da lei trabalhista, pois
estes não conseguem praticar preços tão baixos, argumenta.

Em ações judiciais passadas sobre o tema, juízes deram ganho
de causa às empresas por entenderem que, se o trabalhador tem a liberdade para
entrar e sair a hora que quiser do serviço, ele então não é um empregado, mas
um autônomo. Aoki contra-argumenta: “Você não precisa entrar às 8h e sair
às 17h para ser considerado um empregado. A subordinação vem de outras
maneiras, não apenas pelo controle da jornada”.

O Ministério do Trabalho decidiu que a Rapiddo tem até o dia
19 de junho para regularizar seus funcionários. Se não cumprir o prazo, tomará
outra multa, diz Aoki.

A Rapiddo contesta as acusações e diz que tomará as medidas
cabíveis com as autoridades competentes. Ou seja, provavelmente entrará com um
recurso administrativo dentro do Ministério do Trabalho. E, se necessário,
recorrerá à Justiça.

Outros apps

A Rapiddo não é a primeira startup de logística autuada pelo
Ministério do Trabalho. No ano passado, foi a vez da Loggi, que agora recorre
em âmbito administrativo.

Aoki prefere não citar nominalmente outros apps, mas
confirma que os argumentos usados na autuação da Rapiddo e da Loggi se
aplicariam a outras empresas. Ou seja, novas investigações vêm por aí.

Análise

É papel de auditores fiscais como Aoki fazerem esse tipo de
investigação, à luz da legislação trabalhista vigente. Por outro lado, é
inegável que isso desperta preocupação de investidores estrangeiros e inibe
novos empreendedores.

Cabe destacar que tal discussão não acontece somente aqui,
mas no mundo inteiro, incluindo outros países com legislação trabalhista bem
mais flexível que a brasileira, vide os processos judiciais contra o Uber nos
EUA.

Ressalte-se, por fim, que a nova lei trabalhista brasileira
criou o conceito de trabalho intermitente, que talvez pudesse ser aplicado em
alguns dos apps ora autuados. Aoki preferiu não externar sua opinião sobre esse
ponto.



Artigo originalmente publicado em Mobile Time – 07 de Junho de 2018 as 16:26 – e gentilmente cedido por Fernando Paiva – clique aqui

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